segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Pequena análise sobre a economia brasileira

“Mas liquidez é apenas um lindo nome para mais empréstimos. A única coisa de que podemos estar certos é que todo empréstimo tem encargos de juros os quais algum dia, de alguma forma, terá de ser pago por uma pessoa que trabalha para viver”

Silvia Santos

O Presidente Lula, o Ministro Mantega e o Presidente do BC, o tucano Henrique Meirelles insistem em declarar que a crise das bolsas não é com o Brasil; “o problema é dos EUA”, “aqui estamos blindados”; “temos o BC cheio de reservas”, “fizemos bem o dever de casa” para concluir que não temos que nos preocupar. Então, devemos nos preocupar mesmo. Os sinais de alarma, susto e até pânico são grandes, e mais uma vez não podemos confiar nas palavras do presidente. Quando os expertos e as autoridades monetárias dos países centrais afirmam que o futuro está difícil de prever, que não se sabe quanto durará a crise ou que é difícil fazer previsões, é porque a coisa está grave. Graças à globalização, que expandiu as fronteiras dos bancos, das financeiras, dos fundos de pensão e de todos os especuladores dedicados a buscar lucro rápido e fácil pelo mundo, a crise já não é mais “de um país”. Se a crise do México (95) Ásia (97) Rússia (98) e Argentina 2001 tiveram grandes repercussões na economia mundial, não é difícil de imaginar quando a crise acontece no próprio coração do imperialismo: nos Estados Unidos de Norte América. Sem dúvida, a crise, mais do que nunca, “é de todos”. O Presidente do BC até chegou a afirmar que se uma locomotiva da economia mundial (os EUA) está fraca, temos outra que é a China que puxará a economia. Mas o Sr. Meirelles mente porque sabe muito bem que não é assim. A maioria das corporações imperialistas está instalada na China, se aproveitando do preço da mão de obra barata, quase escrava. Se a economia dos EUA, que já vêm desacelerando, aprofunda este processo ou entra em recessão, suas filiais na China venderão menos, a crise se expandira com maior força e as companhias americanas vão perder mais ainda, visto que seus produtos são feitos na China para os próprios norte-americanos. “Hoje metade das importações americanas supostamente chinesas são produção off shore das empresas americanas para o mercado americano” diz Paul Roberts, economista e ex-assessor do Tesouro no governo Reagan.
A crise não é nova
A crise não é nova. Quem não se lembra da crise das empresas ponto.com também chamada de Nova Economia? Ou da gigantesca Enron que maquiava seus balanços para ocultar as perdas? Com intervalo de alguns anos, o mundo financeiro sofre um abalo, um terremoto, que, como os da escala Richter, tem diferente intensidade e conseqüências. Os últimos 5 anos foram de crescimento da economia mundial e norte-americana. Os EUA pós 11/09 decidiram não só invadir o Iraque para controlar militar, política e economicamente aquela região: decidiram também inundar o seu país e o planeta de dólares para sair da recessão e avançar na sua política colonizadora. Para isso, baixaram os impostos aos ricos; baratearam o crédito e investiram pesadamente na indústria armamentista enquanto crescia a população sem assistência social nem plano saúde. Contando 5 anos de expansão da economia norte-americana, continua havendo 14 milhões de ilegais perseguidos e 40 milhões de pobres na potência mais poderosa do planeta. China, Índia, Venezuela, Rússia, e Argentina após o default, cresceram a ritmos vertiginosos. As corporações norte-americanas produziam cada vez mais em suas empresas instaladas na China, que precisavam do petróleo de Oriente Médio, da Venezuela e/ou da Rússia; do cobre chileno, do ferro gusa brasileiro, da soja Argentina ou do milho mexicano para sustentar seu espetacular crescimento. O preço das commodities foi parar nas nuvens. O crédito farto inundava o mundo; os financistas dos EUA ajudavam a concretizar fusões e aquisições mundo afora, além da compra de títulos, derivativos, bônus, ações, etc. Entretanto, a economia dos EUA mudava seu perfil, passando a ser quase que uma economia de serviços, com seu parque produtivo “of shore” e aumentando seus já crônicos desequilíbrios fiscais e da balança comercial. O apetite de lucro chegou ao crédito imobiliário. A oferta de dinheiro chegou até para aqueles que não ofereciam garantias, ou seja, com grandes possibilidades de não poder pagar. A versão tupiniquim desta política criminosa de envididar todo o mundo, podemos vê-la no credito consignado, presente que o Presidente Lula deu aos bancos e financeiras que perseguem na rua os aposentados e trabalhadores entregando propaganda do crédito fácil. Nos EUA, o direito de receber o dinheiro das hipotecas foi transformado em títulos e vendido aos Fundos de Investimento. Mas os juros aumentaram, o ritmo de venda das casas decaiu, e as residências perderam valor. Assim começou a inadimplência de milhares de mutuários, pois suas prestações tinham juros pós-fixados, e não puderam pagá-las. A partir daí vem a crise que se espalhou pelo mundo, fundamentalmente dos EUA para Europa e Ásia, através dos corretores, bancos e fundos de investimento.
É só uma “gripe” que o mercado corrige?
Em primeiro lugar é importante clarificar que os tais dos “mercados” não são outra coisa que os banqueiros e os especuladores, protegidos pelos governos capitalistas e imperialistas, em primeiro lugar o dos EUA. E em segundo lugar, que não se trata de uma crise passageira, mas de uma crise estrutural da economia capitalista que os banqueiros não só não podem como não querem corrigir. O que eles querem é lucrar. E mais uma vez, quem veio a tentar impedir uma catástrofe maior com a quebra de novas empresas e bancos, foi o Estado através de seus Bancos Centrais (sobre tudo dos EUA e Europa) que injetou mais de 300 bilhões de dólares em poucos dias, “premiando” assim com mais empréstimos ao capital financeiro para que continue apostando no cassino da especulação. No entanto, a intervenção dos Bancos Centrais dos principais países imperialistas pode “adiar” um colapso da economia mundial ou uma recessão, mas não pode curá-la. Porque a lógica do funcionamento do sistema capitalista imperialista é absolutamente irracional: para lucrar mais e mais tem que ir destruindo competidores no caminho, produzindo guerras, mortes e miséria. Quando pela sua própria dinâmica baixa a taxa de lucro, como acontece desde finais da década de 60, busca golpear e derrotar o movimento de massas para acrescentar sua mais-valia, até militarmente, como fez no Iraque, e através dos planos neoliberais, procurando freneticamente o lucro na especulação, criando as famosas “bolhas” que a cada tanto explodem, deixando mortos e feridos no caminho. A doença então é mais grave porque já não se trata de um país da América Latina ou da Ásia, mas do coração do sistema capitalista mundial: os Estados Unidos. Na base política desta situação, dois fatos decisivos e contraditórios: a derrota dos EUA no Iraque jogou por terra a agenda imperialista para aquela região, impedindo uma estabilização dos seus planos. Mas no sentido contrário, a política acelerada de restauração capitalista por parte da burocracia e da nova burguesia chinesa, que cumpre hoje um papel decisivo na manutenção da economia imperialista, ajuda a que a economia mundial não exploda. Por um lado porque possibilita a exploração da sua mão de obra baratíssima por parte das corporações imperialistas recuperando assim parcialmente a margem de lucro; por outro, ao ser o principal detentor de títulos do tesouro norte-americano, se converte no principal credor e o fundamental sustento dos déficits fiscal e comercial do imperialismo ianque.

Alguém ganha e muitos perdem

Os “mercados” atuaram até o limite da irresponsabilidade. Arriscavam porque ganhavam muito. Mas alguns tal vez mais expertos ou prevenidos, fizeram o cálculo e vendo a catástrofe que se avizinhava, venderam seus títulos quando o preço estava lá acima. Ao vender, o preço desabou e milhares de bancos, financeiras ou fundos perderam importantes economias pertencentes a um setor de grandes investidores e a milhões de médios ou pequenos poupadores. Na base da pirâmide, centenas de milhares ou quiçá milhões, perderam ou perderão suas residências nos EUA, começando pelos imigrantes e ilegais. E também, este esfriamento da economia produzirá ainda mais demissões, que já começaram a acontecer no setor financeiro: nos EUA neste ano foram dispensadas 88 mil pessoas sendo que mais de 40% estavam relacionadas aos problemas com o mercado de hipotecas. É quase um fato aceito pela maioria dos analistas que, caso se evite uma recessão haverá uma queda da atividade nos EUA o que naturalmente tende a esfriar a economia chinesa. Pese ao nosso país ter diversificado suas exportações, 24% das vendas brasileiras vão para os EUA e China, sem contar que se estes dois países consomem menos, a queda se alastrará pelo resto do mundo, com baixa dos preços das commodities e um crescimento menor do conjunto da economia mundial.

Lula fez o dever que queriam os banqueiros

Pese as atitudes tranqüilizadoras do governo, há inquietação no mundo empresarial e financeiro. Claro que eles querem que tudo continue como hasta agora, lucrando de forma monumental. De acordo com a Folha de SP, no primeiro semestre de 2007, os cem maiores lucros das empresas com ações na Bovespa foi de R$ 68,1 bilhões, quando no mesmo período de 99 foi de 22,4 bilhões de reais! Para os representantes da FIESP, a incerteza produz um efeito negativo, imobilizante. No Brasil, entre 23 de Julho e 14 de agosto, os fundos de investimento perderam cerca de R$ 8,7 bilhões, visto que a queda nas bolsas levou a um forte movimento de retiradas. De acordo com o Diretor Executivo da Corretora de Câmbio NGO, “nos últimos dias, ao ficarem sem dinheiro nos EUA, os investidores vieram aqui e limparam a prateleira”; os estrangeiros venderam ações na Bovespa e fizeram remessas para exterior o que elevou o dólar. Quando Lula diz ter feito bem o dever de casa, deve precisar da casa de quem: sem dúvida a dos banqueiros. O dever que Lula fez foi aumentar o superávit primário para pagar juros aos banqueiros e para fazer as famosas reservas cambiais. Para que estas poderosas reservas? Para quando viesse a inevitável crise e os especuladores quisessem fugir com seus dólares, o Banco Centra estivesse cheio de dinheiro para que possam voltar tranqüilos e de bolso cheios para suas casas ou seus países. Na conjuntura atual, na qual Lula diz que não acontece nada e estamos fantástico, as agencias de rating, as mesmas que deram boa classificação aos créditos sub prime dos EUA, se apressaram a anunciar as “más notícias” para o Brasil: que a classificação do “grau de investimento” (reconhecimento de bom pagador) demorará e assim eles farão um último teste da resistência do país antes de outorgar a “sonhada” classificação. Ou seja, estas agências controladas pelos especuladores querem que o Brasil demonstre ainda mais que está disposto a preservar a tudo custo seus lucros fabulosos. Por esta razão já começaram as recomendações para “manter a ordem e a estabilidade” dos mercados, o que significa apertar o cinto para fortalecer as reservas e suas remunerações, para lhes dar garantia que frente à provável extensão ou aprofundamento da crise, eles levarão seu quinhão. Como não poderia ser diferente, frente às pressões e as incertezas, setores do governo e da equipe econômica começam a admitir a possibilidade de fazer um superávit primário ainda maior, o que levaria a aumentar o arrocho e o ajuste fiscal e acelerar o passo com as reformas como a terceira fase da reforma da Previdência, a trabalhista, etc. Mais uma vez, pretenderão que a crise provocada pelo andar de cima, seja paga pelos trabalhadores e o povo. Por isso, ao invés de alenta falsas expectativas, dizemos aos trabalhadores: nenhuma confiança no governo Lula e seus ministros! Não vamos pagar pela crise! Frente ao quadro de falência da saúde, da segurança e da educação pública precisamos de mais e melhores investimentos! Precisamos de mais empregos, salários e previdência pública. Para começar a atuar neste caminho, é preciso acabar com o falso superávit e suspender o pagamento dos juros das dívidas, assim como e realizar uma imediata auditoria; taxar as grandes fortunas e controlar a entrada e saída de capitais, com fortes taxações e barreiras à especulação.–

*Richard C. Cook- Analista federal aposentado. Trabalhou 21 anos no Departamento do Tesouro dos EUA.

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